As palavras do jovem garoto iluminado pelas luzes coloridas da fachada me trouxeram um breve sorriso. Sorriso que talvez não tenha o feito entender. Talvez por surpreender. Ou, quem sabe, intimidar.
Com um olhar perguntador, ficou encabulado ao perceber que, certamente, as perguntas teriam continuidade. Abaixou a cabeça... e com os pés, alisou a grama. Então - com uma certa formalidade que nada combinava com aquela calça larga vermelha seguras por um estreito suspensório azul - pediu licença.
Mais um sorriso... e, nessa hora, as perguntas já haviam mesmo fugido. Um momento como poucas vezes presenciei e certamente, na vida, ainda pouco irei. Simples. Suave. Portador de uma poesia sem palavras. Sem pretensão.
No mesmo gramado, as crianças corriam e gritavam contentes. O cheiro da pipoca doce e do algodão, também doce, ajudavam a compôr o primeiro dos espetáculos.
Por alguns minutos permaneci calada. Por alguns minutos permaneci ainda mais atenta. Por alguns minutos, agora, sou capaz de recordar todos aqueles minutos.
Debaixo da lona, o espetáculo começava. O homem da capa e cartola preta foi o primeiro a aparecer. Dentro de um baú, cortou uma de suas assistentes. Logo depois, tochas de fogo eram lançadas para o ar por um outro rapaz, ainda mais novo. Vieram também as moças que deixam o chão com a ajuda de um tecido. Quando acabara de entrar o grupo que, no ar, se exibe de um lado para o outro, vozes de criança me levaram a deixar o grande público.
Elas estavam descalças e ambas sem camisa. Um menino e uma menina. Os joelhos sujos de terra e os descabelados fios de cabelo fascinavam tão quanto a apresentação principal. Nas extremidades da pequena mesa improvisada, jogavam ping-pong no quintal de casa.
Ao redor, traillers enfileirados. Mais de vinte. Na janela de um, uma moça com uma toalha verde nos cabelos segurava uma embalagem de desodorante corporal. Na porta do outro, um senhor com um pão e uma faca nas mãos.
Encostada, e um pouco escondida, continuei a observar aquele modo de vida ainda pouco, por mim, conhecido. Lembrei das palavras do envergonhado jovem logo na minha chegada. Com toda naturalidade, me disse não saber desde quando morava naquele lugar, nem ao certo quando iria deixar a cidade. Se o destino é Guarujá, Praia Grande ou Botucatu... isso é detalhe! Disse que a família dele era extensa e que todos moravam lado a lado e, mesmo quando chegava a hora de se mudar, continuavam a morar lado a lado.
Agora sim, a certeza do imaginado no início da noite. Como diz a música de um grupo musical de palhaços alternativos, ali é ‘tudo uma coisa só’. A casa é onde quiser que seja. A família são todos que, juntos, convivem. A vida é vivida sem contagem de tempo. Risadas também fazem parte e são rotineiras.
Falando nisso, volto à atração principal. Somente alguns passos e lá estava o agora palhaço, antes poeta de um cenário natural. Em ação, ia além. Arrancava contínuas gargalhadas de um incontável público. Um legítimo protagonista para os dois lados do espetáculo... e continuava a encantar. Bastava observar. Mesmo acostumado com tantas risadas, conservava a capacidade de se encabular por qualquer sorriso desconhecido...
Assinar:
Postar comentários (Atom)
3 comentários:
ai, ai, ai... você e o circo! hahahahahahaha. tô vendo que isso já amor, não é nem paixão!
Fantástico! Parabéns mesmo, e escreva sempre...vou colocar seu link no meu blog tá? ;)
não os encurte, estão mto bons!
bjos
Postar um comentário